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Mostrando postagens de abril, 2017

Minhas duas faces- 7ª- O plantão

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  7 ª parte- No dia anterior - o plantão De todos os capítulos, este foi o mais adiado desde quando comecei a escrever essa crônica há meses atrás, o mais doloroso. Tenho muitos anos de prática de medicina, o suficiente para saber que nunca sabemos tudo, que sempre aparecem situações totalmente imprevisíveis e inusitadas, das mais simples às mais complexas. Talvez esse seja o grande mistério da medicina e o grande atrativo para aqueles que estão dispostos a exercê-la com paixão. Mas mesmo sabendo disso tudo, cada momento é novo e desafiador, cada paciente é único e cada fracasso  tem sua dor inevitável. Ele estava lá, um jovem de vinte e poucos anos, sob minha responsabilidade, e eu o perdi. O plantão foi bem difícil na sala de emergência aquele dia, o mais difícil. Ele chegou no meio do dia com insuficiência respiratória. Usava chinelo de dedo, calça jeans e camiseta meio rasgada.  Um jovem de classe baixa, como a maioria das pessoas que chega naquele serviço de saúde. Resp

Minhas duas faces - 6ª -O sonho

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    6ª parte- Duas semanas antes- o sonho Alguns dos nossos sonhos sabemos exatamente que não se tratam de sonhos realmente, mas são espécies de visões, como se alguém que não fala, quisesse nos passar uma mensagem muito complexa, sem palavras e em um curto espaço de tempo. Algumas vezes segundos devem bastar. Geralmente esse “alguém” somos nós mesmos, pelo menos é assim que acontece comigo. Naquela manhã eu acordei mais cedo que o normal, angustiada, com a visão e a sensação do sonho a minha volta. “Havia um grande cachorro preto, ou poderia ser um lobo de tão grande. Ele se enroscava no meu pescoço como uma estola de pele. Uma energia pesada, pegajosa, desagradável, que eu sentia que iria estar comigo por muito tempo. Sabia que não conseguiria me livrar dele rapidamente. Ele iria se esmaecer com o tempo, bem lentamente. E talvez até sempre ficasse a sombra da sua presença. Sua boca estava aberta do lado direito do meu pescoço, na minha orelha, no lado direito do meu rosto, m

Minhas duas faces- 5ª - Um mês antes

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                               5ª parte       Um mês antes - “Boa tarde, meu nome é Patrícia e vou fazer a entrevista por telefone com você. Dura aproximadamente 1 hora e parte do tempo será em inglês, tudo bem?” - “Sim, claro. Podemos conversar quando quiser.” -“ Para começar , sempre gostamos de abordar nossos princípios fundamentais: independência, imparcialidade, neutralidade. Independência significa que não estamos atrelados a poderes políticos, militares ou econômicos; a maior parte absoluta dos nossos recursos vem de doações. Imparcialidade porque oferecemos ajuda aqueles que precisam, sem discriminação de raça, religião, nacionalidade ou convicção política. Neutralidade o que significa que não tomamos partido, seja qual for o conflito ou as partes afetadas. ” - “Sim, já me informei bastante sobre esses princípios e sobre algumas questões organizacionais também.” -“Estou vendo no seu currículo que você tem experiência com doenças infectocontagiosas.” - “ Tenho

Minhas duas faces- 4ª -Um ano antes

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                                4ª parte  Um ano antes Eu chegava em casa voltando de uma longa e fantástica viagem à Índia com o grupo de Yoga. Quase 30 dias em um país fantástico, guiados por um mestre da Yoga e meditação e, principalmente, um ser humano muito especial, o “guru” do nosso grupo. Fizemos uma peregrinação aos templos siks e budistas do norte da Índia e os nossos dias começavam às 5 horas da manhã, com 2 horas de meditação e aula de Yoga.  Portanto, voltei de viagem meio levitando, para rapidamente ser confrontada com algumas duras realidades. Nem imaginava o ano difícil que eu teria pela frente.  O que é que tem maior poder de desestabilizar uma mulher que é mãe? Seus filhos, é claro.  Para começar, minha filha mais nova havia terminado um  noivado, 4 anos de relacionamento. Foi uma conversa difícil: - “ Foram 4 anos, mãe! Eu também não queria, mas não vai ter jeito! Eu preciso seguir minha vida! Não quero ficar com essa sensação de estar marcando passo!

Minhas duas faces - 3ª - A paralisia de Bell

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    3ª parte:  A paralisia de Bell. De frente para uma grande tela de computador, minha colega radiologista me explicou o que estava mostrando o exame. - “ Rachel, aqui está o nervo facial, está vendo essa linhazinha branca aqui? Pois é, isso significa que ele está edemaciado, inchado, mais espessado do que deveria. É uma paralisia de Bell mesmo. Não tem sinal de nenhum tumor aqui. Você teve alguma virose nos últimos dias? “ - “Não, não que eu me lembre, não tive nenhum sintoma, nenhuma gripe, e nunca tive herpes. “ -“ Alguma mudança brusca de temperatura então? ” -  “As mudanças habituais, Marilia. Entra em ar condicionado, sai de ar condicionado. Mas isso eu sempre fiz, não acho que deva ser a razão da paralisia..., não fiz nada de diferente! ” - “ Então sobra o stress, Rachel. Em muitos casos é a causa presumida da paralisia de Bell. E o stress baixa a imunidade. Sabe que é comum chegarem noivas aqui com paralisia facial? Pouco tempo antes do casamento. E executi