10-"Morre o ex-Conselheiro Jose Luiz Baccarini"















Meu pai adorava essa figura, essa charge feita por um amigo, e é com ela que eu finalizo estas publicações. José Luiz Baccarini, advogado, com uma cabeça enorme e um rosto tranquilo; um bandido de uniforme listrado sentado num banquinho ao fundo, com um guarda ao lado. E o advogado defendendo o acusado. Era essa a ideia que ele fazia do direito, a defesa do acusado, do mais pobre, do mais fraco. Muitas vezes do sabidamente culpado por algum delito grave. Meu pai via o ser humano como alguém que intrinsecamente errava, as vezes muito, mas que sempre devia ter uma segunda chance, sempre devia ser perdoado. Talvez porque ele também se sentisse no direito de ser sempre perdoado, e foi, na maior parte das vezes. Para nós, seus filhos, essa charge significou sempre muita coisa. Era o lado dele que nós podíamos ver. Enquanto o outro lado sempre foi um mistério. Pelo menos até o momento em que nós crescemos, ficamos adultos, tivemos nossos filhos... Só aí deu para entender que, na verdade, todos nós temos duas caras, ou até mais, dependendo de com quem estamos, do que estamos fazendo. Nós também somos um mistério afinal! E no fim da sua vida, ele já era transparente para nós quatro. Já sabíamos até prever mais ou menos seus próximos passos, nem sempre sensatos. No final, ele se transformou na criança que precisava ser cuidada.

O que acontece depois que uma pessoa morre é um mistério, vai ser sempre um mistério, apesar de todos os dogmas religiosos, apesar de algumas supostas certezas que possamos ter. Ninguém sabe, na verdade, porque ninguém nunca voltou de lá. Mas algumas coisas são fatos, irrefutáveis. Meu pai vive em mim, nos meus irmãos, nos seus netos. Seus genes são os nossos genes. Seu jeito de andar e de parar apoiando as mãos na cintura é o jeito do meu irmão e do meu sobrinho.  Seu jeito apressado e feio de levar a comida a boca é o meu jeito de comer. Seu temperamento tranquilo e meio desleixado é o temperamento do meu filho...  E por aí vai. Ele agora vai viver também nesses escritos, que saíram de um armário obscuro para uma rede sem limites de acesso para quem quiser lê-los, até quando durar a internet.

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